Um local de alguma cultura, mas também alguma estupidificação, como é revelador ter chegado aos quase 50 anos sem ler o D.Quixote do Cervantes, o próprio, depois de ter perdido tanto tempo a ler tanta treta...Já agora, fale-se aqui muito de Angola...E do resto,desde que não pessoalizem quem não é figura publica como é o meu caso e o meu ocaso!
sexta-feira, junho 03, 2011
Conversão.
Conversão
Quando descobri, no adro da igreja, que o marxismo
era superior ao existencialismo, e que a dialéctica
do marx valia duas vezes o ser do sartre, já
nada podia convencer-me do contrário.A razão
que nós pensamos que temos torna-se o motor do mundo;
e quando aquilo que a faz mover é a gasolina hegeliana,
o movimento dos pistões da tese e da antítese, e
o poderoso acelerador da síntese, então
o sol da terra não passa de uma lâmpada de sessenta voltes,
uma simples faúlha de isqueiro a apagar-se,
a mais pálida chama de vela numa corrente de ar
no canto da igreja.É verdade: entretanto, eu tinha entrado
pela porta lateral, a que dava para o altar onde
ardiam as almas do purgatório, e ajoelhara-me
no confessionário.O marxismo não tinha feito, ainda, com
que me libertasse dessa velha supersticiosa
-a dama religião- mas nessa altura uma das coisas que não
se podia dizer nem ao padre era a crença
no comunismo.Com efeito,
o sonho de revoluções e utopias era o mais inconfessável
dos pecado: a última blasfémia.Mas
eu tinha-o descoberto no adro da igreja, lendo
«A guerra civil de Espanha» do hugh thomas: só muito
mais tarde vim a descobrir que os ingleses optam
esses ideais só para serem excêntricos, ou para matar o pai
(vide o Freud), ou para traírem a própria classe, como
esses dandys que caíram nas fileira republicanas.Assim, o
meu marxismo era uma ideologia aristocrática: algo de
ateniense, numa sociedade em que a vanguarda gozava
todos os previlégios só por pensar melhor
do que os outros.Pode ter sido um equívoco; mas
no adro da igreja eu estava bem acompanhado.Por baixo
da terra que eu pisava, em túmulos anónimos, senhores e
camponeses partilhavam o sono escatológico; mulheres
mortas de parto, vítimas de antigas pestes, padres
missionários nos confins do mundo, juntavam os ossos
na mais exacta das igualdades.Ali, o ser e o nada
lutavam entre si; e o resultado era a superação
dialéctica dos contrários, o princípio fundamental
da filosofia, a luz da matéria
contra a treva do espírito
Nuno Júdice
Ao acabar de ler este poema lembrei-me que o grande poeta basco Gabriel Celaya devia estar a antecipar o Júdice quando poetou “ A poesia é uma arma carregada de Futuro”
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